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Perda de fieis latinos será irrelevante no conclave, diz cardeal brasileiro

 

 

 

A perda de fiéis pela Igreja Católica nos últimos anos na América Latina, região que concentra 41% dos católicos de todo o mundo, não será um fator decisivo na escolha do novo papa, na avaliação do cardeal brasileiro dom Raymundo Damasceno Assis, arcebispo de Aparecida e presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
“Hoje cada vez mais nos tornamos católicos por opção, não por questão tradicional, social. Não é um papa brasileiro que vai transformar todos os brasileiros em católicos”, afirmou dom Damasceno em entrevista na tarde desta quarta-feira em Roma, após participar pela manhã da última audiência geral de Bento 16 como papa no Vaticano.

Para o cardeal, um dos cinco brasileiros que participarão do conclave para a eleição do sucessor de Bento 16, esse não será um critério fundamental na escolha. “Não elegemos o papa porque se perde fiéis”, disse.
Questionado pela BBC Brasil se o fato de dois quintos dos fiéis católicos do mundo estarem concentrados na América Latina poderá ter um peso na eleição do próximo pontífice, dom Damasceno afirmou que é “algo a se considerar”, mas que não será determinante.
“Pode ser que não encontremos um perfil adequado a partir de um cardeal latino-americano”, observou.

Representação

Apesar de ser a região com maior número de fiéis no mundo, a América Latina estará representada por apenas 19 cardeais entre os 115 membros do conclave.
Mais da metade dos cardeais-eleitores são europeus, o que os deixa na dianteira nas bolsas de apostas e nos palpites de especialistas que se multiplicam desde o anúncio da renúncia de Bento 16, no último dia 11.
Para o presidente da CNBB, as escolhas dos papas ao longo dos séculos se concentraram na Europa “porque a Igreja se desenvolveu mais na Europa”, mas a realidade atual é diferente.
“Hoje vivemos num mundo globalizado, onde as pessoas se conhecem mais. Temos também (na América Latina) gente com experiência de Igreja, pastoral, com preparo intelectual, teológico, filosófico. Isso já está universalizado”, comentou.
Para ele, porém, a nacionalidade do próximo papa não é uma questão primordial. “A Igreja é universal. Jesus Cristo não impôs nenhum limite para o sucessor de Pedro. Ele nomeou Pedro o primeiro papa, que nem europeu era. Ele era judeu, da Galileia”, observou, bem-humorado.
“O critério da nacionalidade, de dizer que tem que ser europeu, ou tem que ser africano, não é o critério fundamental. A Igreja é aberta a qualquer pessoa”, afirmou.

Responsabilidade

Dom Damasceno afirmou ainda não ter candidato e afirmou que qualquer decisão deverá ser tomada somente durante o conclave.
“Há uma abertura muito grande de espírito. Posso ter nomes na minha cabeça, mas no momento do conclave podem vir outros nomes, à medida que as discussões vão avançando e conforme você vai convivendo com as pessoas”, disse.
Ele disse sentir o peso da responsabilidade de escolher o novo pontífice, por escolher “alguém que vai conduzir a Igreja”.
“É uma responsabilidade mundial nesse sentido. Como qualquer um que vota (em eleições) deve ter responsabilidade, mas nós mais ainda”, disse.
O arcebispo de Aparecida disse não pensar na possibilidade de sair do conclave aclamado como o novo papa. “Não tenho chance nenhuma de ser papa. Nem comento isso, não passa pela minha cabeça”, disse, rindo.
“Todo mundo sabe das responsabilidades e das exigências. Ninguém pode ter a presunção de achar que é o candidato ideal”, afirmou.
Segundo ele, “todos terão muita humildade e desapego, com abertura para o que Deus quer nos falar. Embora usando a mediação humana, como nós sabemos, porque ninguém aparece com uma estrela na testa para dizer: ‘Este é o candidato'”, disse.

Escândalos sexuais

Durante a entrevista no Colégio Pio Brasileiro, abrigo para padres brasileiros em Roma no qual está hospedado, dom Damasceno também comentou os escândalos durante o papado de Bento 16 relacionados ao acobertamento de abusos sexuais cometidos por padres e afirmou que ele será lembrado com o papa que enfrentou o problema de frente.
“Hoje está muito claro que esse papa não guardou as coisas na gaveta, como dizemos”, disse.
Questionado se também há casos de abusos no Brasil, ele confirmou e disse que “esse é um problema geral”.
“Mas sempre tomamos medidas muito sérias. A Igreja faz seu julgamento interno e também colabora com a Justiça civil, no processo e nas investigações desses casos”, afirmou.
Ele não quis citar casos específicos, porém. “Não vou identificar casos, porque cada um tem sua realidade própria, em sua diocese, em sua igreja local.” Ele afirmou, entretanto, que nunca se deparou com nenhuma denúncia pública em sua diocese.