Para Mirian Goldenberg, que pesquisa envelhecimento há 20 anos, “estamos assistindo horrorizados a discursos sórdidos, recheados de estigmas, preconceitos e violências contra os mais velhos”. A pandemia de coronavírus, que se alastrou pelo mundo e chegou ao Brasil, evidenciou a “velhofobia” de parte da população, para a qual os idosos são considerados um peso para a sociedade.
A opinião é da antropóloga e escritora Mirian Goldenberg, professora titular do Departamento de Antropologia Cultural do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“Esse tipo de discurso já existia antes da pandemia: os velhos são considerados inúteis, desnecessários e invisíveis. Mas agora está mais evidente. Políticos, empresários e até o presidente da República já vieram a público dar declarações “velhofóbicas”, diz Goldenberg (em março, o presidente Jair Bolsonaro chegou a defender apenas o isolamento da população idosa em vez de a população em geral)”.
“Homens e mulheres mais velhos, que já experimentam uma espécie de “morte simbólica”, ficam desesperados ao constatar que são considerados pesos para a sociedade”, acrescenta Goldenberg, que diz ainda que “muitos dos que disseminam o discurso de ódio e de extermínio dos mais velhos já passaram dos 60 anos”.
Circulou nas redes sociais um vídeo em que Nelson Teich, substituto de Luiz Mandetta no Ministério da Saúde, disse: … “então, sei lá, eu tenho uma pessoa que é uma pessoa mais idosa, que tem uma doença crônica, avançada, e ela teve uma complicação. Para ela melhorar, eu vou gastar praticamente o mesmo dinheiro que eu vou gastar para investir num adolescente, que tá com um problema. O mesmo dinheiro que eu vou investir lá é igual. Só que essa pessoa é um adolescente que vai ter a vida inteira pela frente, e o outro é uma pessoa idosa, que pode estar no final da vida. Qual vai ser a escolha?”.
Isto deixou o ministro Nelson Teich em uma situação delicada com os idosos — e, por desdobramento lógico, com todas as pessoas que sejam portadoras de doenças ou de necessidades que requeiram cuidados especiais. “Se tais palavras saíssem da boca de um petista, os extremistas de direita não hesitariam em fazer seus vídeos e memes afirmando: comunista quer matar os velhos”, disse um articulista da Folha de S. Paulo, recentemente.
Por aqui, em Ponte Nova, é comum você se encontrar com pessoas que falam abertamente: “você não pode circular por aí. Tem que ficar em casa, pois é grupo de risco”. Outros, ironicamente falam: “o caminhão cata véio está circulando, esconde se não eles te levam”. Parece que isto é uma brincadeira. É mesmo, mas de mau-gosto, velhofóbica (roubando a expressão de Goldenberg) e extremamente maliciosa e maldosa.