Carregando data e hora...

Motoristas são coagidos por `despachantes´ no Detran-MG

 

 

 

As barreiras para quem quer fazer uma transferência de veículo sem passar por um despachante vão muito além da burocracia na preparação dos documentos. É praticamente impossível chegar à fila de vistoria do Departamento de Trânsito de Minas Gerais (Detran-MG), na Gameleira, região Oeste de Belo Horizonte, sem ser abordado por, no mínimo, cinco pessoas oferecendo serviços de despachantes. Se fosse apenas a oferta da prestação do trabalho, o problema não seria tão grave. A questão é que, na grande maioria das vezes, a abordagem é agressiva e, em alguns casos, há até coação para contratação do serviço.
Uma economista que não quis se identificar já havia contratado um despachante, mas chegou sozinha à fila e teve que dar explicações para não ter que contratar um outro profissional. “Ele disse que obrigatoriamente eu teria que pagar R$ 5 para ficar ali. Quando disse que já tinha despachante, ele me levou até uma loja próxima, onde tive que falar o nome de quem eu tinha contratado para então me liberar da cobrança”, conta.
Há também um esquema para furar a fila.
“Eu fiquei duas horas esperando a minha vez. Quando estava chegando perto da entrada do Detran, um homem me mandou esperar, porque outro carro iria passar à minha frente”, conta o motorista José Carlos. O veículo só não furou a fila porque ele começou a discutir com o rapaz. “Ele viu que eu iria criar caso e deixou eu seguir à frente, mas, em seguida, ele parou o carro que estava atrás de mim e conseguiu furar a fila”, diz.

A reportagem de O TEMPO visitou o local e foi recebida da mesma forma pelos agenciadores oferecendo os serviços. Mas os problemas não pararam por aí. Ao tentar estacionar o veículo, um flanelinha chegou até onde estava o carro e tentou cobrar, antecipadamente, o valor de R$ 5 para deixar o carro no local.
Ele só desistiu da cobrança após o motorista afirmar que esperaria dentro do carro. A poucos metros do Detran-MG, não havia nenhum policial para coibir a atuação desenfreada dos flanelinhas no local.

ALERTA. O presidente do Sindicato dos Despachantes de Trânsito de Minas Gerais, Orlando Reis, afirma que os homens que atuam livremente nas imediações do Detran-MG não são despachantes credenciados e que a questão é de responsabilidade das autoridades policiais. “Não são despachantes. São agenciadores. Não são sindicalizados e atuam da mesma forma que flanelinhas”, explica o dirigente. Ele ainda credita os problemas na porta do Detran-MG às questões sociais. “Muitos deles são pessoas em situação de vulnerabilidade. Alguns são usuários de drogas que aproveitam a situação pra ganhar um dinheiro a mais para comprar entorpecentes. Eu já soube até de roubo de carro no local”, afirma Reis.
Por meio de nota, a Polícia Civil afirma que as pessoas que sofrerem algum tipo de coação devem fazer queixas na delegacia, mas diz que quem deve fazer a fiscalização de despachantes é o próprio sindicato da categoria. O texto também afirma que 90% dos procedimentos são feitos pela internet e garante que a fila é respeitada. “Para concluir o serviço de vistoria, a Divisão de Registro de Veículos faz a distribuição de senhas, e o atendimento é priorizado por ordem de chegada”, informa a nota oficial.

Comércio
Preços de produtos e serviços são até 2.500% mais altos
Quem conseguir driblar a coação dos despachantes, mas precisar de algum serviço de última hora, também vai ter que preparar o bolso. Isso porque o preço de uma simples cópia pode ficar 2.500% mais alto do que o valor cobrado em outras regiões. Enquanto a cópia de uma página custa, em média, R$ 0,10, o serviço é oferecido no entorno do Detran-MG por até R$ 2,50. O menor preço encontrado pela reportagem foi de R$ 0,35.
O valor das placas vendidas no local também está acima da média. Quando um dos ambulantes que estavam no local foi abordado, outros três tentaram disputar a possível venda. “Ele falou olhando para mim. Então, a venda é minha”, esbravejou um dos homens, em tom ríspido. A “determinação” acabou respeitada pelos demais. Em seguida, ele ofereceu o jogo de placas por R$ 90. Durante a negociação, o preço caiu para R$ 70, mas ainda está acima do cobrado nas lojas onde é possível encontrá-las até por R$ 60.
Na hora de comprar o extintor, os próprios agenciadores desestimulam o comprador. “Olha, eu não tenho extintor aqui, mas nas lojas próximas é caro. Melhor você ir ao posto mesmo”, diz um deles.
“Todo esse abuso de abordagem e de cobrança exagerada atrapalha o trabalho do despachante, que é regulamentado e preparado para isso”, afirma o presidente do Sindicato dos Despachantes de Minas Gerais, Orlando Reis. (BM)
Saiba como transferir seu veículo
Valores. R$ 122,58 é o preço da taxa cobrada pelo Detran-MG para fazer a transferência de veículo, incluindo a vistoria, que deve ser realizada presencialmente no bairro Gameleira, na região Oeste de Belo Horizonte.
Procedimento. Além de pagar a taxa para fazer a transferência, é preciso o preenchimento da ficha cadastral e apresentação de cópia da carteira de identidade e do CPF de quem está adquirindo o veículo.
Fila. Apesar dos relatos de venda de lugar na fila, o Detran-MG garante que é respeitada a ordem de chegada, inclusive com distribuição de senhas. O órgão também destaca que 90% dos procedimentos podem ser feitos pela internet e que a contratação de despachante é uma prerrogativa do cidadão.
Preços. O custo de uma cópia no local chega a ser até 2.500% mais alto do que o valor cobrado pelo serviço em outros lugares.