Cientistas americanos anunciaram nesta quarta-feira ter criado embriões saudáveis a partir de três doadores.Segundo eles, o novo tratamento de fertilização in vitro, que já causou polêmica, foi testado em humanos e em animais e gerou resultados “promissores”.
A descoberta foi publicada na revista científica Nature.
Os embriões humanos foram criados em laboratório e tinham aparência normal, enquanto macacos nascidos por meio da mesma técnica permanecem “saudáveis”, disseram os especialistas. Os animais têm três anos de idade.
Uma consulta pública sobre os padrões éticos do uso desse tratamento deve ser realizada no Reino Unido nos próximos dias.
O resultado será encaminhado ao secretário de Saúde do país (cargo equivalente ao do ministro da Saúde brasileiro) no ano que vem.
A técnica foi concebida para prevenir doenças mitocondriais fatais e debilitantes, que são passadas das mães para os filhos e que também causam fraqueza muscular, cegueira e insuficiência cardíaca.
O tratamento envolvendo os três doadores usa a informação genética central da mãe e do pai e a insere em um embrião de um doador com mitocôndrias sadias.
As mitocôndrias estão presentes no citoplasma dos óvulos – tal como a clara do ovo de uma galinha. Elas contém somente uma pequena fração do material genético e são responsáveis por determinar características como a textura do cabelo ou a cor dos olhos contidas no núcleo – um pontinho da gema, na mesma analogia.
Os cientistas vêm estudando duas maneiras de criar embriões a partir de três doadores.
Uma delas é tirar o núcleo do óvulo da mãe e inseri-lo em um óvulo de uma doadora que possui mitocôndrias saudáveis e que teve seu núcleo previamente removido. Esse novo óvulo poderá, então, ser fertilizado com o esperma do pai.
A outra forma é fertilizar o óvulo da mãe primeira antes de remover seu núcleo e inseri-lo no embrião de um doador.
O estudo conduzido pelos cientistas americanos centrou-se na primeira opção.
Teste
Para dar início à pesquisa, a equipe colheu óvulos de sete mulheres que concordaram em participar do experimento.
Os cientistas, então, substituíram o DNA mitocondrial em 65 óvulos e, durante aproximadamente uma semana, analisaram a evolução do material.
A taxa de fertilização foi similar em 33 dos óvulos que não haviam sido previamente manipulados, embora metade deles possuía alguma anormalidade.
Os que fertilizaram se desenvolveram até o estágio blastocístico cinco ou seis dias depois, patamar em que os embriões oriundos de fertilização in vitro são normalmente transferidos para as trompas da mãe – em uma taxa de controle similar.
Masahito Tachibana e sua equipe afirmaram que a pesquisa revela que a técnica pode funcionar, pelo menos, em laboratório. Ainda não se sabe, contudo, se o procedimento poderia originar um bebê saudável.
Os cientistas agora querem saber se podem fazer mais estudos para assegurar que o tratamento é seguro.
Mary Herbert, professora da Universidade de Newscastle e especialista no tema, também vem estudando a fertilização in vitro a partir de três doadores, mas usando um outro método que tira o núcleo de um embrião já fertilizado.
Ela descreveu as últimas descobertas como “encorajadoras” e disse que elas serviam de prova de que o procedimento estava no caminho certo, embora tenha defendido que sua técnica apresentará melhores resultados.
Futuro
Antes de qualquer um dos métodos ser usado para ajudar casais a terem bebês saudáveis, o governo britânico precisará aprovar o tratamento, que receberá uma licença do órgão regulador – a Human Fertilisation and Embryology Authority (HFEA).
Uma aprovação nos mesmos moldes também terá de ser feita em outros países.
No ano passado, a HFEA revisou a efetividade científica das duas técnicas. No documento final, o órgão regulador decidiu que os dois métodos poderiam ser úteis em prevenir uma anormalidade mitocondrial, mas recomendou que novos experimentos fossem feitos para garantir a segurança do procedimento.
Para Peter Braude, professor de obstetrícia e ginecologia da Universidade King’s College London, “é exatamente sobre esse tipo de ciência que o comitê de especialistas da HFEA cobra mais testes, de modo a averiguar a eficiência da técnica”.
“Entretanto, ainda temos um longo caminho a percorrer até que o tratamento possa ser usado em humanos”, acrescentou.
Segundo Braude, “apenas um em cada cinco embriões fertilizados normalmente chegam ao estágio em que podem ser implantados”.
“Isso significa que para se ter certeza de quais embriões podem ser transferidos, em torno de 12 embriões são necessários, o que nem sempre é possível em um tratamento de fertilização in vitro”.